31 de março de 2010

Os encontros, ou melhor, os "encontrões" de Adoniran e Elis

Elis Regina encontrou Adoniran Barbosa pela primeira vez em 1965, quando o compositor ainda não tinha gravado disco, mas já era considerado ícone do samba paulista. O compositor participou ao vivo do Fino da Bossa na Record depois de muita insistência de Elis. Na ocasião, 12 de julho de 1965, após emocionada interpretação de Saudosa Maloca feita por Elis, mais uma entrevista de 10 minutos, os dois levaram ao vivo as músicas Bom Dia, Tristeza e Prova de Carinho. No mesmo ano, quando a Excelsior fechou contrato com a emissora paulista para realizar uma versão inédita do Fino no Rio, Adoniran foi imediatamente relacionado pelo produtor Alberto Helena, mas muitos da direção do programa ficaram receosos com a possível reação negativa da platéia carioca. Qual. Mesmo antes de entrar no palco, Adoniran foi ovacionado pelo público, que cantou em pé seu sucesso instantâneo Saudosa Maloca, recém composto.
Os dois só se reencontrariam 13 anos depois, quando Elis, às voltas com os ensaios do mega show Transversal do Tempo, incluíra Saudosa Maloca na seleção de repertório e precisava da autorização do autor. Como na época era muito complicado contatar o compositor, Elis pediu a força do amigo em comum Walter Negrão, que encontrou Adoniran reticente, mas conseguiu marcar um encontro na padaria Real, próxima à TV Tupi. Cesar Camargo Mariano, marido da cantora na época e Negrão, presenciaram Adoniran, entre torresmos, risadas e copos de cerveja, se levar pelos irresistíveis encantos de Elis. A música foi aprovada, claro, e apareceu com destaque no show e no disco lançado no ano seguinte. A descontração e o clima da padoca rendeu repeteco no final de 1978, no Bar da Carmela no Bixiga, com a dupla dividindo vocais em Iracema. O vídeo deste encontro, feito para o especial de Ano-Novo da cantora na Band, virou, mais de 30 anos depois, um grande must na internet, via Youtube. Além das internas no bar, onde Adoniran canta Samba no Bixiga e arranca gargalhadas contagiantes e espontâneas da cantora, há também um tranquilo passeio da dupla a pé pelo bairro, tendo Saudosa Maloca em pungente interpretação de Elis,ao fundo.
Em 1980, Adoniran retribuiu e chamou a gaúcha para uma participação especialíssima na faixa Tiro ao Álvaro, do seu terceiro LP. Elis chegou ao Rio ( atrasadíssima, para não perder o costume) e depois de um longo abraço no anfitrião, ensaiou e gravou com grande entusiasmo - e nem preciso dizer que a música foi destaque retumbante, virando até compacto de divulgação do trabalho.
Elis Regina faleceu em 19/01/1982, com 36 anos de idade e uns 100 anos de serviços prestados à MPB. Adoniran, que se emocionou muito em seu adeus, partiu no mesmo ano, em 23/11/1982, aos 72 anos, cansado, mas ativo e intenso, como seu velho Bixiga. Assim como Cartola, Geraldo Filme, Nelson Cavaquinho e tantos outros, só foi ter o prazer de ver sua obra gravada em disco próprio no final da vida. Graças, para nós e para a posteridade, que dois dos mais autênticos artistas brasileiros tiveram a chance de se encontrar e unir suas genialidades. A rouquidão e o dialeto de Adoniran + o canto sentido e o riso solto de Elis ecoam ainda hoje por bares, palcos e e-mails compartilhados.
Encontro no Bixiga ( completo): http://www.youtube.com/watch?v=Ea5nMXIRxQM
Elis e Adoniran em Tiro ao Álvaro: http://www.youtube.com/watch?v=ACg4OxVDr_w

29 de março de 2010

RR 50

Não. Eu não vou me aprofundar na cena punk brasiliense dos anos 70, quando Renato Russo, os irmãos Fê e Flávio Lemos e um filho de diplomata sulafricano, André Petrorius, criaram o pioneiro Aborto Elétrico. Também não vou conjecturar sobre a fase "solo" de Renato Russo entre 81 e 82, quando se apresentava como "Trovador Solitário", munido só com o violão e o vozeirão. Não vou me prolongar também na maior banda de rock dos anos 80, Legião Urbana, que vendeu milhares de discos, encheu estádios e protagonizou momentos bizarros de idolatria e violência. Vou deixar de fora qualquer análise depurada sobre as múltiplas facetas de Renato Russo: o punk indolente, o crânio da escola, o professor de inglês, o homossexual , o debilitado, o drogado, o poeta, o fissurado em música e bandas de rock, o irritante da turma, o agitador cultural, o sensível, o gênio difícil, o vocalista perfeccionista.
Quase tudo foi falado e refalado, escrito e reescrito nos últimos dias, por ocasião dos 50 anos redondos de seu nascimento. Vou deixar nese post solamente minha lembrança/saudade de um artista que faz falta pra cacete neste cenário morno, repetitivo e reciclado do rock brasileiro atual. Renato Russo nunca viveu no meio termo e sua vida pós morte também não é assim: crucificam-no e santificam-no na mesma dosagem. Nem tanto ao céu, nem tanto ao inferno, eu, que vivenciei Legião e Renato Russo desde que surgiram para o cenário nacional, fui ao antológico show deles em 1985 em Santo André ( com Mister Átila, no Clube Aramaçan), cantei muitas músicas do Legião em minha banda dos anos 90, W.O, e acompanhei atentamente seus vôos solos e o drama final de sua curta e acelerada vida, sempre o considerei o melhor vocalista que surgiu em qualquer época de nosso pop/rock, um dos melhores letristas de sua geração e um baita cara autêntico. Autêntico, eis um adjetivo que vem faltando às novas bandas rockers, cheias de pompas e circunstâncias, mas sem recheio. Renato Russo não só tinha recheio, como transbordava.
Seguem grandes momentos de sua carreira ( Aborto, Legião, solo em inglês e raridades):
Solo: The Dance - http://www.youtube.com/watch?v=25fITWp06nY&feature=related
Solo: Cherish - http://www.youtube.com/watch?v=6iGKWV_24tM
Legião: O Senhor da Guerra - http://www.youtube.com/watch?v=iEHjJcjtZmg
Legião: Tempo Perdido - http://www.youtube.com/watch?v=059HEaYRve0&feature=related
Legião: Que País é Esse ( Globo de Ouro-1987)- http://www.youtube.com/watch?v=OdMwXkzDusc&feature=related
Aborto Elétrico: Desemprego ( Raro!)- http://www.youtube.com/watch?v=l_GK1CrdFxM&feature=related
Aborto Elétrico: Fátima (Raro!) - http://www.youtube.com/watch?v=uDoQb2nYBYo&feature=related
Renato cantando Cazuza: http://www.youtube.com/watch?v=7Un6XazRDgE&feature=PlayList&p=7BC58971890643B1&playnext=1&playnext_from=PL&index=1

Trovador Solitário: Boomerang Blues - http://www.youtube.com/watch?v=PpuooTNUYVQ&feature=PlayList&p=33EEF9EB8C08F721&playnext=1&playnext_from=PL&index=21

Solo: When You Wish Upon a Star - http://www.youtube.com/watch?v=tPIiwDnbN3A&feature=PlayList&p=33EEF9EB8C08F721&index=24

26 de março de 2010

Baú do Malu 22 - Revista Careta nº 951 - 11/09/1926

Capa - charge de Storni sobre a famosa "política do café com leite"
Cartum de Belmonte

Página com a cobertura da missa de 7º dia de Rodolpho Valentino, no Rio.

A revista Careta foi publicada entre 1908 e 1960, criação do editor Jorge Schmidt ancorada ao longo de sua existência por desenhistas geniais como Raul Pederneiras, Belmonte e Storni, entre outros. O mais genial deles, J.Carlos, considerado por muitos o maior artista gráfico brasileiro, vivenciou a redação da Careta por toda a sua vida, sendo diretor e artista exclusivo da publicação desde o seu início até 1921 e colaborando em suas páginas até a sua morte. J.Carlos ( José Carlos de Brito e Cunha) nasceu em 1884 e faleceu em 1950, três dias após sofrer uma edema cerebral em sua mesa de trabalho. Profissional exemplar, colaborou em 48 publicações e estima-se que deixou para a posteridade a incrível marca de 50 mil desenhos publicados. A Careta foi sua casa, principalmente nas décadas de 10 e 20, quando exercia várias funções editoriais. Na segunda metade da década de 20 ( período da revista em destaque), sem a presença do mestre J, Belmonte e Storni seguravam muito bem a peteca e povoavam a magazine com suas ilustrações provocativas.
A revista, erroneamente chamada de "humorística" pela internet afora, na verdade era uma revista semanal jornalística e de costumes, utilizando-se de muitas ilustrações e fotos para mostrar a política, a cultura e o comportamento do seu tempo. Por ter sempre uma caricatura ou charge como capa, talvez venha daí a pecha equivocada.

* Acima, exemplar do meu baú, com destaque para a capa e dois detalhes internos escolhidos à dedo.

22 de março de 2010

Big Star: morre o brilhante e obscuro Alex Chilton

Alex Chilton, guitarrista e vocalista de Memphis, Tennessee, já chamava a atenção na adolescência pelo seu modo pouco tradicional de tocar e cantar, embebido precocemente em influências britânicas. Com 17 anos, em 1967, estourou com a música The Letter, ao lado de amigos de infância na banda Box Tops. Depois de mais duas canções nas paradas, o grupo se dissolveu em 1969 e Chilton foi tocar a vida solo, aperfeiçoando-se em Nova York . Eis que em 1971 um convite muda para sempre o seu destino na música: a banda Big Star, formada por Chris Bell ( guitarra/vocal), Andy Hummel (baixo) e Jody Stephens (batera) precisava de um guitarrista e viu a luz ao topar com a irresistível aura melódica de Chilton. Formou dupla histórica com Chris Bell em composições imediatamente clássicas - era como uma versão garagística de Lennon/McCartney - mas que por problemas de distribuição do primeiro disco ( #1 Record - 1972), acabou virando cult para poucos privilegiados ( músicos e críticos principalmente) mas desconhecida para o público em geral. Bell não segurou a barra e sartou de banda em 1972 mesmo, iniciando carreira solo tragicamente interrompida seis anos depois, em acidente de carro. O teimoso Chilton seguiu com a Big Star, entre trancos, barrancos e ligeiras interrupções e chegou a gravar outro disco muito cultuado, Radio City de 1974, com as matadoras "September Gurls" e "Back of a Car". Mesmo com um certo burburinho nas rádios, a banda, mais uma vez, não teve o reconhecimento que merecia. No final do ano, após gravações de estúdio que virariam disco só em 1978, a banda resolveu encerrar suas atividades. Só para se ter uma idéia da importância desse subestimado grupo para o Rock 70, simplesmente os três únicos álbuns da banda estão na lista dos 500 melhores de todos os tempos da revista “Rolling Stone”. Mas a vida, ingrata vida, segue. Chilton caiu no mundo again, mais precisamente no olho do furacão novayorquino pré-punk, o CBGB, clube que abrigou ícones do movimento como Ramones, Television, Blonde e Patti Smith, onde conheceu e acabou produzindo os pitorescos The Cramps. Nos anos 80, flanou pelo jazz no Missouri e manteve uma estável e discreta carreira solo, até que um comichão chamado Big Star jogou-o mais uma vez para os palcos do velho power pop, ao lado do parceiro Jody Sthephens, impávido nas baquetas.
A banda tocou muito ao vivo e chegou a gravar um disco de inéditas, In Space, em 2005. Em 2009 foi lançada a caixa comemorativa "Keep an eye on the sky" e um documentário sobre a banda será lançado em 2010. Chilton, que ainda cultivava carreira solo paralela, iria se apresentar com o Big Star no sábado (20), no festival South by Southwest, em Austin, Texas, mas na quarta-feira (17) passou mal, foi hospitalizado e não resistiu a um infarto. A apresentação de sábado aconteceu, como uma grande celebração em sua homenagem em que convidados especiais revezaram-se no palco reverenciando o mestre Alex Chilton. Aos 59 anos, se foi um grande padrinho do rock alternativo americano e das garage e college bands ( que o digam REM , Weezer e tantos outros), um músico e compositor conciso, naturalmente melódico, que brilhou longe dos holofotes, em clubes apertados, festivais alternativos e bares pantanosos.

Frases:
“O ideal para mim seria ganhar um monte de dinheiro sem que ninguém te reconhecesse na rua".
“A fama é muito pesada para sair carregando por aí. Eu não quero ser como Bruce Springsteen. Eu não preciso de tanto dinheiro e não quero 20 seguranças me seguindo”.
“Se eu ficasse realmente famoso, os críticos não gostariam tanto de mim. Eles gostam de promover as zebras musicais”.
Destaques:
Box Tops - The Letter ( programa de TV - 1967)- http://www.youtube.com/watch?v=wD9mCp8SifM&feature=related
Big Star -Thirteen(do álbum #1 Record -1972)- http://www.youtube.com/watch?v=pte3Jg-2Ax4
Big Star-I'm in love with a Girl (do álbum #1 Record -1972)- http://www.youtube.com/watch?v=QIfPIwWn-vg&feature=related
Big Star - September Gurls ( do álbum Rádio City - 1974)-http://www.youtube.com/watch?v=BNKSs1J38EA&feature=related
Big Star- Back of a Car (do álbum Rádio City - 1974)-http://www.youtube.com/watch?v=hsPKKuQmJJQ&feature=related
Big Star -Ballad of El Goodo ( classicão de Bell/Chilton - 1972)-http://www.youtube.com/watch?v=Cn1t6l7UUPc&feature=related
Big Star - In the Street ( ao vivo na tv americana) - http://www.youtube.com/watch?v=fAtb65Z_bkA&feature=related
Big Star - In the Street (versão da abertura do seriado That's 70's Show) - http://www.youtube.com/watch?v=P_3ECxWjPyc&feature=related
Big Star - live -Rhythm Festival Clapham, Bedfordshire- 2008 - http://www.youtube.com/watch?v=obixXiy9ses&feature=related
Big Star - Thank You Friends ( 1971/1972- c/ cenas da formação original) - http://www.youtube.com/watch?v=JC0Wa3P_dO0&feature=related

15 de março de 2010

Glauco e o Salão de Humor de Piracicaba



O Salão Internacional de Humor de Piracicaba é um dos mais importantes salões do Brasil. Desde 1974, sem interrupções, já revelou para o Brasil grandes artistas do traço, como Solda, Chico Caruso, Lor, Flávio. Entre as revelações dos primeiros tempos, um trio que iria estourar a boca do balão na década de oitenta: Laerte, Angeli e Glauco. O primeiro cravou um 1º lugar logo na edição inaugural e repetiu a façanha em 1977. Angeli ficou com o 3º lugar em 1975 e Glauco se destacou em 1977 e 1978 ( 2º e 3º respectivamente).
O livro acima, que eu demorei pra encontrar na atual "zona" que se encontra meu acervo, é uma coletânea dos cartuns premiados no Salão de Piracicaba no período da ditadura ( 1974-1984). Uma curiosidade: nesta mesma época, o irmão de Glauco, Cesar Augusto Vilas Boas, que assina Pelicano, também conseguiu boas colocações nas edições setentistas do salão.
Destaquei acima, a capa do livro ( que retrata a ilustração do poster oficial de 1979, feita por Glauco) e as criações premiadas de Glauco em 1977 e 1978. Por elas, dá pra se ter uma visão nítida do clima reinante e da coragem intrínseca que sempre permeou o Salão de Piracicaba nas barbas ditatoriais.

12 de março de 2010

Glauco

Quantos anos! sou assinante do UOL desde que trabalhava na Editora Abril no início dos 90, e um dos meus hábitos diários desde aquele tempo, era procurar as charges e quadrinhos da incrível trinca Laerte/Angeli/Glauco ( Los 3 Amigos, Angel Villa, Laertón e Glauquito), que vinha publicando esporadicamante desde os anos 70 na Folha de São Paulo, conquistou espaço definitivo no jornal a partir de 1984, e com o advento da internet nos 90, surgiu automaticamente no portal UOL, do mesmo grupo Folha.
Mas bem antes, e eu até postei outro dia aqui, já via os desenhos peculiares de Glauco e Angeli na última página do suplemento Folhetim no início dos anos 80, época em que meu pai comprava a Folhona. Um pouco depois, colecionei a saudosa Chiclete com Banana, revista que marcou os anos 80, com quadrinhos antológicos de Angeli, sempre com convidados especialíssimos, e entre eles, claro, Glauco e Laerte. Foi nesse período que surgiram os primeiros projetos como Los 3 Amigos ( postado aqui também), que teve a adesão posterior de outro louco do bem, Adão Iturrusgarai ( autor de Aline). Com o sucesso da Chiclete, surgiram alguns anos depois "filhotes" editoriais como "Piratas do Tietê" de Laerte, "Geraldão" do Glauco, e "Níquel Náusea", de Fernando Gonsales.
Bom, escrevi todo este histórico pra homenagear Glauco Villas Boas, um dos maiores cartunistas/chargistas/quadrinistas do Brasil, premiado no Salão de Piracicaba, um dos artistas mais ativos a partir do final da Ditadura, autor de diversos personagens marcantes como Geraldão, Geraldinho, Dona Marta, Zé do Apocalipse e Doy Jorge. Triste, porque não é um post-homenagem em vida, como eu bem gostaria. Hoje de madrugada, o cartunista de 53 anos foi morto covardemente dentro da sua casa em Osasco, em tentativa de assalto e sequestro que também levou a vida de seu filho Raoni, 25 anos.
O seu desenho sarcástico, irreverente, doido, veloz vai ficar pra sempre na história do humor brasileiro. Matam-se pessoas, sonhos, projetos, mas a arte, soberana arte - talhada, pintada, desenhada, encenada - essa ninguém mata.

Tiras de Glauco, publicadas no espaço Humor do UOL: http://www2.uol.com.br/glauco/
Obras disponíveis no mercado: http://www1.folha.uol.com.br/folha/livrariadafolha/ult10082u705854.shtml

10 de março de 2010

Baú do Malu 21 - Primeiros números da Revista Senhor (1959)

(Senhor nº1 - capa Glauco Rodrigues)

(Senhor nº 5 - capa Glauco Rodrigues)

(Senhor nº 10 - capa Jaguar)
A revista Senhor foi uma senhora revista. Em sintonia com os esperançosos e eufóricos anos JK, a publicação revolucionou o modo de se fazer revista cultural, inovando no design e disposição dos textos, além de capturar com muito senso os novos ares comportamentais da época. Não por acaso, a revista nasceu um ano antes de Brasília e morreu no parto do golpe militar. A lista de colaboradores e editores nos primeiros anos dá uma idéia do alto nível: Nahum Sirotsky (editor chefe), Paulo Francis (editor assistente), Luiz Lobo (editor), Newton Carlos ( redator), Otto Maria Carpeaux, Odylo Costa Filho, Reynaldo Jardim, Flávio Rangel, Clarice Lispector, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Rubem Braga, Jorge Amado, Antonio Callado, Carlos Lacerda (tu, Lacerda?), Lúcio Rangel, Ivan Lessa, entre tantos outros. E claro, o excepcional departamento de arte, com Carlos Scliar chefiando, Jaguar e Glauco Rodrigues detonando. As capas eram de uma plasticidade acachapante; o logo da revista, oito décadas depois do pioneiro Ângelo Agostini, não tinha parada certa na capa, mudando tamanho, lado e direção de acordo com o layout.
Acima, três exemplares do meu acervo ( nº 1 de março de 1959, nº5 de julho de 1959 e nº 10 de dezembro de 1959).

5 de março de 2010

Faltaria bossa à Bossa se não houvesse Johnny Alf

A Bossa Nova foi ungida a partir da batida diferente do violão de João Gilberto, das composições geniais do piano de Tom Jobim e da apaixonante escrita de Vinicius de Moraes, o primeiro poeta a escrever "letras de canções" de fato, e não poesias musicadas. Esse caldo todo levantou fervura em 1958, quando violão, canção e letra apareceram de uma só vez no LP de Eliseth Cardoso, "Canção do Amor Demais", pontuando o início do movimento, que se reconheceu como tal logo em seguida. Mas cinco, seis anos antes, o pianista Alfredo José da Silva, conhecido na noite como Johnny Alf, já mostrava bossa antes que o termo existisse, em disputadas sessions nas boates de Copacabana. Com vinte poucos anos, Alf já era cultuado entre seus colegas profissionais da noite, como Dolores Duran (que virou sua amiga íntima), Newton Teixeira (com quem dividiu forças depois, em várias boates) e Tom Jobim ( que o apelidou de Genialf) e todos eles não perdiam a oportunidade de "esticar" depois do batente, só pra ouvir a mágica harmonia pianística de Johnny Alf. João Gilberto, recém chegado da Bahia, já era assíduo desde a Cantina do César, primeiro emprego do pianista. No Clube da Chave, Ary Barroso aparecia só pra vê-lo. Além de ser um dos primeiros compositores-intérpretes e misturar Cole Porter com samba-canção, o inusitado instrumentista ainda tinha um vocal vibrante e confessional, que também fez escola. As suas antológicas performances no bar do Hotel Plaza ( entre 1953 e 1954) viviam dando casa cheia - quem quisesse conhecer o que mais de moderno estava sendo feito na música, tinha que dar um pulo no Plaza. Em 1955, deixou sua platéia carioca desamparada quando aceitou convite para tocar em São Paulo na boate Baiúca, mas antes lançou um 78 com as músicas Rapaz de Bem/O Tempo e o Vento ( compostas em 1953), considerado um marco por conter muitas características do que viria a ser Bossa Nova. Finalmente quando a bossa virou Bossa, em 1959, Johnny foi lembrado como pioneiro e participou de muitos shows universitários no Rio, embora continuasse pelas boates paulistas. Até que em 1962, voltou ao Rio, e iniciou uma 2ª fase carioca avassaladora, no Beco das Garrafas - Bottle's, Little Club, Top Club - onde formou o melhor conjunto de sua carreira, com Tião Neto no baixo e Edison Machado na bateria. Vou mais longe: este encontro fantástico foi com certeza uma das melhores formações instrumentais da música brasileira em todos os tempos. A platéia se renovava e novos talentos como Roberto Menescal, Luis Eça e Carlos Lyra corriam ao Beco para ver Alf brilhar. A partir do final dos anos 60, a ensolarada Bossa Nova entrou numa "animação suspensa" e só voltou do coma induzido nos anos 90. Se o nosso Johnny Alf já era retraído, tímido, fugidio, a ponto de recusar o convite para tocar no Carneggie Hall em 1962, na famosa noite da Bossa Nova que consagrou muita gente boa ( e outras nem tão boas assim) por medo de avião, esse período de hibernação bossanovista o fez se refugiar nas sombras ainda mais. Virou professor, continuou tocando na noite ( em São Paulo, agora em definitivo) e compondo lindamente como sempre. Algumas dessas músicas chegaram à luz, como Eu e a Brisa, interpretada por Márcia no III Festival de MPB da TV Record em 1967, que foi desclassificada nas eliminatórias mas virou sucesso de público e uma das músicas mais tocadas do pianista a partir daí. Recusou mais um convite nos anos 70, desta vez de uma de suas musas, Sarah Vaughan, que queria levá-lo para NY. Nos anos 90, com o revival do movimento que ajudou a criar, o sofisticado Johnny Alf deu as caras, primeiro em um belo disco, Olhos Negros, lançado em 1990, com vários intérpretes homenageando sua obra em duetos. Seguiram-se shows por todo o Brasil, um prêmio Shell em 1999 e momentos emocionantes nos 50 anos da Bossa, quando interagiu ao vivo com grandes nomes como Tom Jobim, Ella Fitzgerald, Frank Sinatra e Stan Getz, no telão montado para a exposição "Bossa na Oca" no Ibirapuera-SP, e no ano passado, quando comemorou seus 80 anos no Sesc Pinheiros ao lado de sua amiga Alaíde Costa e Emílio Santiago.
Há três anos vinha se tratando de um câncer de próstata, e como a música sempre esteve em primeiro plano em sua vida, passou a ensaiar como membro fixo do coral do Hospital Mário Covas em Santo André-SP, próximo à casa de repouso onde passou a residir. O mesmo hospital que o homenageou em 2008 com a presença de Toquinho e convidados. Por essa época, quando soube que o grande pianista estava há poucos quilômetros de minha casa, tive um estalo de fã e fui até o hospital em dia de ensaio. Cheguei no finalzinho, e ainda consegui pegar seus últimos acordes no piano. Fui apresentado ao mestre, que me estendeu a mão e sorriu, e comentei com o professor responsável que pretendia me integrar ao grupo, mesmo sabendo que o coral era para funcionários e seus familiares - nada mais poderia justificar minha presença ali. Saí satisfeito por ter presenciado as inebriantes notas de Johnny Alf, mesmo que por poucos minutos. No ônibus, de volta pra casa, relembrei o que já lera sobre sua trajetória: a perda do pai aos três anos de idade; o encontro com o piano aos 9 anos, na casa em que sua mãe trabalhava como doméstica, sob total consentimento dos patrões; o seu amor pelas músicas americanas, que o fez se aproximar do clube Sinatra-Farney, ainda nos anos 40; o rompimento com a mãe, logo que iniciou sua carreira como pianista da noite; a imensa timidez e o gigantesco talento, sempre juntos, que o fizeram um artista cult e admirado, mas que ao mesmo tempo o distanciaram dos holofotes e do sucesso comercial; seus poucos e mal distribuidos discos, sempre com composições modernas e lampejos geniais.
Ontem, dia 04 de março, uma brisa suave, como as notas de seu piano, levou o octagenário e silencioso Johnny Alf.
Vídeos:
Chico Buarque e Johnny Alf: http://www.youtube.com/watch?v=jQWLgdiU_gI

3 de março de 2010

Baú do Malu 20 - Zé Carioca - Horas felizes nº 10 - Melhoramentos (1945)



Zé Carioca surgiu durante a política de boa vizinhança engendrada pelos EUA na iminência da 2ª Guerra. Washington estava de olho grande na influência nazista em países latino americanos e essa preocupação incluía também o Brasil, em pleno regime ditatorial de Getúlio Vargas. O "enviado" Walt Disney, recusou a faceta política da visita, mas fechou um gordo contrato com o governo americano para produzir curtas da viagem. Disney viajou ao longo de 1941 pela America do Sul com uma enorme equipe de desenhistas. No Brasil, visitaram Manaus e jantaram com Getúlio Vargas na antiga capital federal. J.Carlos, nosso cartunista maior, não só se encontrou com a comitiva no Rio, como colaborou nos esboços que dariam vida a um certo papagaio. O seu domínio latente e absoluto no desenho fez com que Disney o chamasse para trabalhar com sua equipe em Hollywood, e ele quase foi: aos 45 minutos do segundo tempo, desistiu. O papagaio esboçado chegou aos States, virou Joe Carioca e estrelou já no ano seguinte o filme Saludo, Amigos! ( Alô, Amigos!) onde ciceroneava o Pato Donald no Rio. Em 1945, enquanto o papagaio malandro voltava às telas no filme Você já foi à Bahia? (The Three Caballeros), contracenando novamente com Donald, além do mexicano Panchito e e alguns artistas de carne e osso ( como Aurora Miranda), a Editora Melhoramentos trazia Zé Carioca para a sua coleção Horas Felizes, com história baseada no filme de 1942. O sucesso e a importância deste livro foram tais, que motivaram a editora a lançar em 1995 uma edição comemorativa de 50 anos, preservando as imagens originais e o enredo.
Lá em cima, a capa de 1945; em seguida, a capa comemorativa (1995); e por último, uma cena interna da edição de 1945.

1 de março de 2010

Cilibrinas do Éden

Como o quilométrico post anterior citou, as Cilibrinas do Éden eram Rita Lee e Lucia Turnbull nos idos de 1973, logo depois da primeira ter saído dos Mutantes. Na verdade, podemos considerar que Lucinha também saiu do grupo, pois no LP de 1972, O primeiro Dia do Resto de Sua Vida ( solo de Rita Lee, mas com toda a trupe mutante à tiracolo), participou cantando e tocando guitarra. A proposta da dupla relâmpago era fazer um rock acústico e baladeiro, e esta linha foi sua ruína: o público queria ver ao vivo um som parafernálico a la mutante e encontraram flautas, vocais suaves e theremin. Na estréia das Cilibrinas, no Phono 73, algumas vaias e um suspeito silêncio sobrepujaram os poucos aplausos. Lucia sentiu na pele o clima e Rita declarou na época que o som ficou uma droga. Será mesmo? Ainda assim, seguiram, e conseguiram gravar um disco pela Philips, mas como reza a lenda - e essa história de cilibrinas e éden está coberta de lenda - o boss André Midani interviu pessoalmente e abortou o projeto. E a lenda segue emocionante: em represália ao ato ditatorial do chefe, Rita se uniu a Tim Maia, desafeto recente de Midani, e destruiu seu escritório na gravadora em uma certa madrugada. Outra boa, e esta não é lenda: no seu disco solo, Arnaldo Baptista dá uma cutucada em Rita em trecho da música Ce tá pensando que eu sou lóki?: "cilibrinas pra lá, cilibrinas pra cá, eu tô velho mas gosto de viajar…"
O disco de 10 faixas tem um ar amador e desencanado que soa intencional, em oposição às suítes roqueiras de então. Há belos momentos vocais e sons que remetem à dupla hippie Luli & Lucinha ( contemporâneas, mas que só gravaram anos depois). O grupo acompanhante era o Persona, com Carlini, Marcucci e Emilson, um pouco antes de virar Tutti Frutti. Muitas músicas foram reaproveitadas anos depois: Mamãe Natureza foi recauchutada pela Philips e utilizada no disco de estréia do Tutti Frutti no ano seguinte; Bad Trip inspirou Shangri-lá, do repertório solo de Rita e Gente Fina é Outra Coisa transformou-se em Loco-Motivas, faixa da trilha da novela global homônima de 1977 com o Tutti Frutti.
Um disco descolado e bacana, simples até, que no distanciamento do tempo, ganhou sua aura de brilho. Virou lenda, mas está disponível pra quem quiser conhecer, graças à fãs incondicionais que o lançaram em LP e vinil em 2008 na Europa ( e inevitavelmente dowloadou pela internet) e disponibilizaram página no MySpace.

Tutti Frutti na linha de frente do Rock 70

Nos obscuros anos 70, bandas de rock surgiam aos borbotões no Brasil, mas assim como vinham à tona, submergiam sem deixar vestígios. A ditadura e seus tentáculos, afundavam o rock no underground com a pecha de "música marginal". Paralelamente ao preconceito oficial, a própria postura dos envolvidos, que não queriam "se vender ao sistema", faziam com que todo roqueiro brasileiro tivesse mesmo cara de bandido, como bem frisou Rita Lee em feliz achado que logo tratou de musicar ( "todo roqueiro brasileiro tem cara de bandido", na música Orra Meu, 1980). Se a maioria, ao centrar forças no hard ou no progressivo, não aparecia para o grande público, algumas poucas bandas conseguiram furar o bloqueio, caso do O Terço, Os Mutantes e Rita Lee & Tutti Frutti. Outras como O Som Nosso de Cada Dia, Made in Brazil, Bolha, Casa das Máquinas, O Peso, viraram cults, mais pelos fãs fiéis e momentos isolados na carreira que propriamente pelo êxito comercial. O Terço era progressivo por essência, mas casava muito bem a excelente instrumentação com letras viajantes e um pé na vida hippie. Depois do auge entre 1973 e 1977, passou por várias fases e gêneros e resiste até hoje, sob a batuta do fundador Sérgio Hinds. Já os Mutantes, após o estouro nos anos 60 e alguns sucesso iniciais nos 70 ( Top Top, Balada do Louco...), fincaram bandeira no progressivão a partir de 1973, ano em que Rita Lee foi "despachada" pelos rapazes. A banda não se encontrou mais com o sucesso, viu Arnaldo Batista sair logo em seguida e embora continuasse lotando os shows, acabou em 1978, após várias mudanças, sob os ombros cansados do insistente Sérgio Dias. Rita Lee, depois de uma frustrada dupla com Lucia Turnbull (Cilibrinas do Éden), que participou do show coletivo Phono 73 e fez um disco inteiro não lançado pela gravadora Philips, formou o Tutti Frutti ao lado da própria Lucia (vocal e guitarra), e integrantes do grupo Lisergia, Luis Sergio Carlini (guitarra solo), Lee Marcucci (baixo – ele mesmo, fundador do oitentista Rádio-Táxi) e Emílson Colantonio, bateria. Lançaram em 1974 o LP Atrás do Porto tem uma Cidade, primeiro disco oficial de Rita Lee longe do Mutantes – seus dois primeiros solos não contam aqui porque foram gravados com a sua banda anterior ( Build Up em 1970 e Hoje é o Primeiro Dia do Resto da sua Vida, 1972). O disco, muito criticado, não revelou toda a explosão que a banda mostrava ao vivo, mas trouxe dois sucessos, Menino Bonito e Mamãe Natureza ( esta, uma versão remodelada dos tempos das Cilibrinas) e revelou a sinergia de Lucia e Rita, letras irreverentes e bem tramadas ( sempre de Rita), a espaçosa guitarra de Luis Sérgio Carlini e a cozinha segura (a bateria em estúdio, foi revezada por Mamão e Paulinho). Na capa, por imposição da gravadora, a nova banda surgia como Rita Lee & Tutti Frutti ( logotipo que apareceria nos próximos discos também). Neste primeiro lançamento, já ficava claro o direcionamento musical do grupo, sem resquícios do progressivo que flanava sobre seus contemporâneos: um rock bem urdido, com temperos de blues, Stones , Faces e a postura glitter de Bowie e T-Rex.
Lucia Turnbull, primeira guitarrista do rock brasileiro, saiu pouco depois do lançamento, após desentendimentos com o produtor Mazola, e perdeu a chance de participar de um dos melhores discos de rock tupiniquim dos anos 70, Fruto Proibido, de 1975, pela Som Livre. O grupo, embora tenha ficado com uma só guitarra, arregimentou um pianista ( Guilherme S. Bueno, só no estúdio), um tecladista (Paulo Maurício) e backing vocals ( os irmãos Rubens e Gilberto Nardo), fixou um batera ( Franklin Paolillo) e chamou o multi-instrumentista Manito, ex-Incríveis e ex-Mutantes ( onde ficou por pouco tempo no lugar de Arnaldo Baptista), na época no Som Nosso de Cada Dia, para tocar sax, flauta e órgão em algumas faixas.
O resultado foi além das expectativas. Rita Lee encorpou mais seus vocais (puxados para o grave), dimensionou suas composições ( três com Paulo Coelho, uma com Luis Sérgio, outra com Lee, além de quatro só com a sua assinatura) e se desgarrou do passado mutante. Carlini se consagrou neste disco, em várias passagens, mas principalmente pelo seu solo em Ovelha Negra, inspiradíssimo e inspirador. O LP vendeu bem e rendeu pelo menos três grandes sucessos: Agora Só Falta Você, Esse Tal de Roque Enrow e Ovelha Negra. Antes de engatar o terceiro disco, Entradas e Bandeiras (1976), a banda cravou uma ótima música na trilha sonora da novela O Grito, Lá Vou Eu (saída de um compacto duplo e creditada só para Rita Lee), uma balada rock com a cidade de São Paulo ao fundo, gravada depois por Zélia Duncan. O terceiro disco veio em um ano conturbado para o grupo. Rita ficou estafada ao longo do primeiro semestre, as gravações se arrastaram e quando finalmente ficou pronto, decepcionou público e crítica ( e o prório Tutti Frutti). Além de não gerar nenhum hit, as mixagens deixaram o LP sem “viço”, pasteurizado e empastelado. Carlini e banda continuavam honrando os instrumentos (o batera agora era Sergio Della Monica), mas a gravação não ajudou. O engraçado é que o técnico de gravação era Luis Cláudio Baptista, irmão mais velho dos mutantes Arnaldo e Serginho, considerado um mago da sonoplastia e acústica, exercendo a mesma função no aclamado disco anterior. O que pode ter interferido no resultado é a co-participação de outros dois técnicos, acho eu. Entre estafas e estofos, ainda deu pra salvar alguns momentos, como a pungente Coisas da Vida ( um dos melhores momentos de Rita) e Bruxa Amarela, uma versão com letra totalmente remodelada da censurada Check-Up (Raul Seixas- Paulo Coelho). 1976 não daria só estafa à Rita, mas também uma prisão, um marido e uma gravidez! Conheceu o instrumentista Roberto de Carvalho, da banda de Ney Matogrosso ainda na estafa, engravidou logo em seguida e em agosto, teve sua casa invadida pela polícia, que flagrou-a com posse de maconha e decretou sua prisão. Rita ficou uma semana no Deic, um mês no hipódromo feminino e um ano em prisão domiciliar.
Sem poder excursionar pelo resto do ano, a banda se preparou para as próximas gravações e no início de 1977 soltou no mercado o compacto de maior vendagem em sua história: Arrombou a Festa , mais uma parceria de Rita Lee e Paulo Coelho, feita ainda na prisão, e que avacalhava com muita perspicácia a apática MPB do final daquela década. O LP do ano foi ao vivo e em parceria com Gilberto Gil e sua banda Refavela (que tinha entre seus membros, Lucia Turnbull), Refestança ( Som Livre – 1977). Claro que o hino do disco foi a velha É Proibido Fumar – além de Rita, Gil também tinha virado bode expiatório no ano anterior com sua prisão por posse de maconha.
O Tutti Frutti neste período já incluía Roberto de Carvalho nos teclados e foi com ele e seus arranjos que o grupo lançou um estouro em vendas, o long-play Babilônia, com os hits Babilônia e Miss Brasil 2000. Mas junto com os holofotes do sucesso, veio a ruptura. O fundador Luis Sergio Carlini, que havia semeado na Pompéia o germe da futura Tutti Frutti, ao lado de Emilson e Marcucci em bandas como Coqueiro Verde e Lisergia no início dos 70, se sentia no final da década totalmente deslocado. E acabou ‘sartando’ fora, deixando Rita, Marcucci & Cia, mas levando no bolso o nome Tutti Frutti. Vale lembrar que Babilônia foi o primeiro disco da banda com destaque na capa apenas para o nome de Rita Lee. Rita & Roberto seguiram em sua lua-de-mel musical pelos anos seguintes, colecionando hits pops, como todo mundo já sabe. O Tutti Frutti recomeçou do zero, com Carlini recrutando seu velho amigo Simbas no vocal ( ex-Casa das Máquinas), Juba na bateria ( que logo depois pulou para a Blitz) e Renato Figueiredo no baixo. Mas o entusiasmo inicial, que incluía novíssimas músicas e gravadora nova (Capitol), logo virou novela dramática, quando uma música retida na censura atrasou o lançamento do disco e acabou desfazendo o contrato fonográfico, depois de um compacto sem grandes conseqüências no início de 1979. Com novo baterista, Marinho Thomaz, a banda finalmente lança em 1980 seu LP, Você Sabe qual o Melhor Remédio, pela RCA, mas promessas vãs de um outro disco e dificuldades diversas no prosseguimento da carreira fizeram com que o antológico Tutti Frutti encerrasse suas atividades em 1981. Por esse disco derradeiro dá pra perceber o quanto Carlini continuava craque. O novo século viu um retorno do Tutti Frutti pelas mãos do incansável Luis Sérgio Carlini e ele vem mantendo um boa média de shows pelo país. Vale a pena ver um ícone da guitarra no Brasil. Um cara que levantou e segurou por anos a fio a bandeira do rock nos esquisitos anos 70, tempos de uma ditadura criminosa que taxava de criminoso e bandido quem impunhava uma guitarra.
(Valeu, Almir, eis o Tutti aqui)
Seguem alguns grandes momentos do Tutti Frutti:
*SuperStafa (1976) - http://www.youtube.com/watch?v=Ue5fxQfTb70&feature=PlayList&p=C79ACE944CA3396B&playnext=1&playnext_from=PL&index=34
*Ovelha Negra (clipe do Fantástico- 1975) - http://www.youtube.com/watch?v=pJ4FMFPIf40&feature=PlayList&p=C79ACE944CA3396B&playnext=1&playnext_from=PL&index=33
* Splish Splash (ao vivo 1975) - http://www.youtube.com/watch?v=ORiIlPKMgts
* Sem Cerimônia ( ao vivo no 1ºHollywood Rock ) - http://www.youtube.com/watch?v=2fgixlMFkNg&feature=related
* Mamãe Natureza ( ao vivo no Teatro Bandeirantes -1974 ) - http://www.youtube.com/watch?v=X0wI1aVP69E&feature=related
* De pés no Chão ( ao vivo no Teatro Bandeirantes -1974) - http://www.youtube.com/watch?v=eWIdcXCXkOM&feature=related