31 de dezembro de 2014

Meus 12 Discos Preferidos

Vou inaugurar essa nova série - que surgiu após a leitura do livro "Discoteca Básica - 100 Personalidades e Seus 10 Discos Favoritos", com organização de Zé Antonio Algodoal - com a seleção totalmente emocional dos meus 12 discos preferidos. Se fosse uma seleção mais racional eu tinha incluído Beatles, Pink Floyd, Gilberto Gil, Genesis, Tom Jobim, Free, The Who, Queen,The Cure, ou seja, favoritos que fazem parte da minha vida, mas que eu fui conhecendo aos poucos, sem baques ou queixo caído logo de primeira. Esses meus "12 discos preferidos" abaixo - sim, eu aumentei dois discos da ideia original e alterei "favoritos" para "preferidos" mesmo sabendo que nada acobertará a minha cara de pau em prosseguir com o mote do antenado e bem relacionado Zé Antonio, ex-diretor da MTV e fundador do cultuado Pin Ups, mas também ciente de que essa ideia é compartilhada via magazines, blogs e redes sociais a muito muito tempo  - são aqueles que vieram com tudo logo na primeira ouvida e esse "com tudo" pode ser uma iluminada no cérebro, uma explosão de sentidos, levitação corporal, êxtase profundo, etc. São discos que me comoveram de prima, me impressionaram de imediato, e que levaram essa impressão até o último minuto da última faixa, formando uma obra completa inesquecível que sempre volta para os ouvidos. Para se chegar a esses 12, deixei de lado muitos outros "preferidos", mas que por um detalhe ou outro acabaram limados da seleção definitiva. Alguns por não ter a coesão necessária de todas as músicas, outros por falta de espaço mesmo. E ainda teve aqueles artistas/bandas que eu adoro, como Tom Zé, Elis Regina, REM, Miles Davis, Noel Rosa, Billie Holliday, Elton John, Nick Drake, entre tantos, que eu sempre ouvi, mas de um modo mais solto, sem me concentrar em um disco completo. Da primeira seleção que elaborei, acabaram descartados esses todos: Elvis Presley (1956); Ella & Louis (1956); Miles Davis - Kind of Blue (1959); The Dave Brubeck Quartet - Time Out (1959); Getz/Gilberto (1964); John Coltrane -  A Love Supreme (1965); Bob Dylan - Highway 61 Revisited (1965); Chet Baker - Baker's Holiday (1965); The Beatles - Revolver (1966); Quarteto Novo (1967), Tropicália (1968); Jimi Hendrix - Axis: Bold as Love (1968); Mutantes (1968); Van Morrison - Astral Weeks (1968); Led Zeppelin (1969); Rolling Stones - Let it Bleed (1969); King Crimson - In the Court of the Crimson King (1969); Free (1969); Blind Faith (1969); Black Sabbath - Paranoid (1970); Eric Clapton - Layla (1970); McCartney (1970); Tim Maia (1970); Bad Donato (1970); Janis Joplin - Pearl (1971); The Who - Who's Next (1971); Marvin Gaye - What's Going On (1971); The Allman Brothers Band - Live At Fillmore East (1971); Roberto Carlos (1971); Stevie Wonder - Talking Book (1972); Novos Baianos - Acabou Chorare (1972); Big Star - #1 Record (1972); Slade Alive! (1972); Genesis - Foxtrot (1972); Uriah Heep Live (1973); Pink Floyd - The Dark Side of the Moon (1973); Secos & Molhados (1973); Luiz Melodia - Pérola Negra (1973); Elis & Tom (1974); Jards Macalé - Aprender a Nadar (1974); Mahavishnu Orchestra - Apocalypse (1974); Gilberto Gil - Refazenda (1975); Rita Lee & Tutti Frutti (1975); Queen - A Night at Opera (1975); O Terço - Criaturas da Noite (1975); Creedence - Chronicle, vol.1 (1976); Cartola (1976); Ramones (1976); Stanley Clarke - School Days (1976); Beto Guedes - A Página do Relâmpago Elétrico (1977);  Egberto Gismonti - Carmo (1977); The Police - Outlando's d'Amour (1978); Chico Buarque (1978);  Zé Ramalho (1978); Van Halen (1978); Michael Jackson - Off the Wall (1979); Caetano Veloso - Cinema Transcendental (1979); Chic (1979); Oswaldo Montenegro (1979); Kiss - Dinasty (1979); Angela Ro Ro (1979); The Clash - London Calling (1979); Os Borges (1980); Manowar - Battle Hymns (1980); Donald Fagen - Nightfly (1982); The Cure - Concert (1984); Cantoria (1984); Stevie Ray Vaughan -Couldn"t Stand the Weather (1984);  Ira! - Mudança de Comportamento (1985); O Adeus de Fellini (1985); Peble Rude -O Concreto Já Rachou (1985); The Smiths - The Queen is Dead (1986); Legião Urbana - Dois (1986); The Style Council - Cafe Bleu (1986); Titãs - Cabeça Dinossauro (1987); Kães Vadius - Pshycodemia (1987); Nei Lisboa - Carecas da Jamaica (1987); Patife Band - Corredor Polonês (1987); Aerosmith - Pump! (1989); Neil Young - Ragged Glory (1990); Red Hot Chili Peppers - Blood Sugar Sex Magik (1991); Thin Lizzy - Dedication...(1991); Black Crowes - The Southern Harmony...(1992); Geraldo Azevedo - Ao Vivo Comigo (1994); Marisa Monte - Verde, Anil, Amarelo, Cor de Rosa e Carvão (1994); Renato Russo - The Stonewall Celebration Concert (1994); Paulinho da Viola - Bebadachama (1997).
São 86 discos a mais! E se rolasse outra seleção amanhã, não só a lista definitiva seria outra, como esses sobressalentes também teriam muitos acréscimos. É assim mesmo: essa sadia brincadeira de escolher discos abre valas abissais que estão ali, guardadas entre o coração e a mente. Afinal, os discos são nossos aliados queridos por toda a vida.
A lista definitiva ficou assim (sem ordem de preferência):

1- Leno (feat. Raul Seixas) - Vida e Obra de Johnny McCartney (1970/1971)


Um divisor de águas na carreira de Leno ( que queria abandonar o bom mocismo da jovem guarda), de Raul Seixas ( produtor na CBS na época, começando a transpor para o disco sua porção Raul no lugar do compositor Raulzito de "Doce doce Amor" e rocks comportados) e do próprio rock nacional, que ficaria mais lisérgico, pesado e metafórico nesses anos pesados da ditadura. Mas os militares não queriam saber de contrarevolução na cultura e censurou boa parte das letras, a maioria de Raul. A gravadora, sem cerimônia, aproveitou a retaliação e acabou não lançando o disco. Inclusive avisou Leno que as fitas masters seriam apagadas. Mas em 1995, o pesquisador Marcelo Fróes (sempre ele) descobriu as fitas originais intactas e finalmente o disco foi lançado, com acréscimo de vocais e overdubs de instrumentos, pelo selo independente do próprio Leno, Natal Records (e depois relançado no exterior nos anos 2000). Me surpreendeu logo na primeira ouvida, pela postura desafiadora, o peso da banda A Bolha ( Rolling Stones até o osso), o pioneirismo da gravação em oito canais, as letras espertas e a unidade das faixas. Foi a primeira investida "in loco" de Raul Seixas em um disco pós-Panteras: na produção, nos arranjos, compondo, tocando e ajudando nos vocais.Um disco moderno até hoje, que merece ser mais conhecido.

2- Velvet Underground - Loaded (1970)

Geralmente os discos que aparecem nas listas por aí são o "Velvet Underground & Nico" (1967) e o "Velvet Underground (1969), ambos ótimos, mas o meu VU de cabeceira é esse último da formação clássica, onde a banda aparece mais desencanada do que nunca ( calejada pelos fracassos comerciais dos três últimos discos) e embora ainda subterrânea e ainda sob a égide do submundo urbano, acordes e vocais quase interceptam uma nesga de claridade. Disco perfeito para ouvir antes de qualquer noitada!

3- David Bowie - Hunky Dory (1971)


David Bowie aqui já era compositor do mega sucesso "Space Oditty", mas ainda estava tateando sua persona no show business. Foi nesse disco que ele se tocou que sua obra podia ter várias facetas e nessa transição anterior à explosão "Ziggy Stardust" construiu o primeiro disco realmente "fodaço". da carreira. Dessa amálgama bem engendrada surgiram clássicos instantâneos como "Changes", "Oh You Pretty Things", "Quicksand" e "Queen Bitch".

4- Jehtro Tull - Aqualung (1971)

Assim como o "Foxtrot" do Genesis, esse é o disco que me introduziu no mundo progressivo e me fez decorar cada respiração de Ian Anderson entre uma flautada e outra. A verdade é que o grupo só entrou na classificação "progressivo" para ser situado em algum subgênero do rock, pois a sua fusão de folk, blues, jazz, música clássica e hard rock sempre fundiu a cabeça de quem ousou classificá-lo. Uma boa introdução para quem acha que o rock não pode ser inteligente.

5- Milton Nascimento e Lô Borges - Clube da Esquina (1972)

Talvez o disco que eu mais tenha ouvido. Eu já conhecia algumas músicas, mas depois de ler o ótimo livro do letrista Márcio Borges "Os Sonhos Não Envelhecem" resolvi mergulhar na história do Clube da Esquina e consequentemente ouvi à fundo todos os grandes clássicos do movimento, desde o embrionário "Milton" de 1970 até o familiar "Os Borges" de 1980. Esse primeiro Clube da Esquina ( também existe o Clube da Esquina 2 de 1978) impressiona a cada ouvida: os arranjos e orquestrações, as texturas jazzísticas , as referências históricas, as metáforas políticas, os efeitos vocais, as participações especiais, o revezamento dos músicos em vários instrumentos, e principalmente, o entrosamento único que fez desse disco um dos mais coesos e emocionantes da vasta discografia brasileira. Não à toa, é um dos mais cultuados entre os músicos estrangeiros, até hoje.

6- Rolling Stones - Exile on Main Street (1972)


Quem me conhece sabe que eles não podiam ficar de fora da minha lista e nessa seleção, a inclusão de qualquer lançamento dos Rolling Stones entre 1968 e 1972 seria perfeitamente coerente, pois foram os anos mais intensos da banda de rock mais antiga do mundo. Fico com o "Exile", considerado o melhor por muitos stonemaníacos, por ser um disco que sempre oferece novas leituras a cada mergulhada. Nessa época o grupo fugia dos impostos na França e boa parte das gravações foram feitas nos porões de um casarão, transparecendo nas músicas esse clima claustrofóbico. Junte a essa atmosfera de pub, blues, soul, rock and roll, rythm and blues, spirituals, vocais gospel, sinergia perfeita de instrumentos, guitarras afiadas e agressivas, uma das melhores performances de Mick Jagger, e eis um disco impressionante.

7- Sá, Rodrix & Guarabyra - Terra (1973)

Junte três versáteis instrumentistas que compõem e mandam muito bem também nos vocais. Acrescente uma nova vertente, praticamente criada por eles: o Rock Rural, um subgênero que junta rock progressivo, toada mineira, folk, Beatles, country e folclore nordestino. Desse caldeirão surgiu o trio Sá, Rodrix & Guarabyra, que em dois discos apenas pela EMI ( esse e "Passado, Presente e Futuro de 1972) fizeram um som inovador, com instrumentação e qualidade de gravação no mesmo nível do que se fazia no rock internacional à época. Além de instrumentos "exóticos" como ocarina, craviola, conga, ganzá, chicote e madeira ( esses quatro últimos para formar uma verdadeira banda de pífanos em "Pendurado no Vapor"), o trio permeia tudo com cordas tradicionais e o órgão Hammond de Rodrix para as partes quentes. No auxílio luxuoso, Moreno e Magrão ( aqui chamados de Luiz Morenão e Sergio Magrelo), que entrariam em seguida para O Terço. Um disco imprescindível para se conhecer a evolução do rock brasileiro.

8- Sérgio Sampaio - Eu Quero Botar Meu Bloco na Rua (1973)


Um disco que me pegou pela carótida. O irrequieto e arredio Sérgio Sampaio lançou esse disco na rabeira do megasucesso "Eu Quero Botar Meu Bloco na Rua", que estourou em vendas como compacto. Inesperadamente, o LP não vendeu o que a gravadora imaginara, talvez porque o Sampaio criador fosse muito mais complexo e dinâmico do que a marchinha popular antevia. No auge da forma, o compositor capixaba, amigo de Raul Seixas ( com quem cometeu o anárquico "Sociedade da Grã Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10) desfila em doses proporcionais, sambas, marchas, blues, arranjos psicodélicos e letras corrosivas e dilacerantes ( sem perder o humor negro). Sampaio nunca mais conseguiu reaver o sucesso comercial do compacto, muito pelo seu gênio irredutível, mas também pela visão míope das gravadoras. Hoje, a geração da internet (graças a abnegados como Sérgio Natureza e Zeca Baleiro) vem redescobrindo seu legado e o colocando no patamar dos maiores criadores da nossa música brasileira. Nada mais justo. Maldito é a p....

9- Itamar Assumpção - Beleléu Leléu Eu (1980)


Esse disco, na minha humilde opinião, é um dos mais revolucionários da música brasileira. Tanto, que até hoje ninguém conseguiu decifrar totalmente seus códigos. Moderno até hoje, conta com a blindagem musical da Isca de Polícia ( e não por coincidência, um de seus integrantes, Paulo Barnabé, cometeria outro disco revolucionário oitentista, o "Patife Band - Corredor Polonês") e a malícia, a teatralidade, a poesia e o impacto discursivo do mentor Itamar, muito bem acompanhado pelos vocalizes femininos sempre presentes em sua obra. Beleléu tem postura rap muito antes do rap, e a mistura de ritmos ( que não chega a ser samba, nem rock, nem blues, nem jazz, mas é isso tudo) aliada à crônica de costumes da cidade periférica faz de Beleléu Leléu Eu o grito primal da Vanguarda Paulista e um petardo fumegante apontado para o futuro.

10- Tom Waits - Rain Dogs (1985)

Conhecia o bardo Tom Waits de nome, mas quando botei a agulha nesse "Rain Dogs", logo que o disco saiu, enlouqueci. New Orleans, bourbon, serenata, inferninho, vaudeville, cortiço, pântano, beco, boemia, gim, gigolô, prostituta, blues, bar, coração despedaçado, hotel barato, bêbados, gato preto, e por aí vai: as criaturas e paisagens noturnas das composições delirantes saem da garganta arranhada de Waits enquanto por detrás, uma big band propositadamente desconjuntada tenta unir os estilhaços. Gutural e profundo, é o que se pode dizer do grande Tom Waits, e esse disco o pegou no ponto certo entre o underground e o mainstream, trazendo o seu nome para o letreiro luminoso da música mundial.

11- Travelling Willburys - Vol.1 (1988)


Uma festa! depois de uma descontraída reunião entre Bob Dylan, Tom Petty e Roy Orbison para gravar o single"Handle with Care" do LP "Cloud Nine" de George Harrison, os quatro gostaram do resultado e juntos a Jeff Lynne ( ex-ELO e produtor de George) formaram a banda Travelling Wilburys em outubro de 1988, todos com seus devidos pseudônimos ( membros da família Wilbury). O veterano Roy faleceu em dezembro, mas a tempo de ver o sucesso e a repercussão do disco. Merecidamente, pois todas as faixas foram feitas com muita paixão. Uma reunião desse quilate poderia ter sido um fiasco ( vide histórias anteriores com supergrupos) ao unir egos dilatados, mas a paixão comum pelo rock and roll e a música estradeira fez com que todos se esbaldassem, se divertissem e fizessem músicas apaixonantes e iluminadas. Além de tudo, um era fã do outro, e juntos, fizeram um dos discos mais ensolarados dos anos 80.

12- Guinga e Aldir Blanc -Simples e Absurdo (1990/1991)


Eu já acompanhava o Aldir Blanc desde o seu início de carreira, ainda com a turma do MAU (Movimento Artístico Universitário), quando compôs a maravilhosa "Amigo é Pra Essas Coisas" em parceria com Silvio da Silva Jr. e logo engataria uma fértil parceria com João Bosco que renderia clássicos absolutos. O Guinga eu conhecia por nome, e sabia ser ele um violonista dos melhores, que já tinha gravado com bambas do choro e do samba, mas que nos últimos tempos voltara exclusivamente para seu consultório de dentista. Quando vi esse disco juntando os dois, comprei na hora. E não me arrependi! Com participações marcantes como Chico Buarque, Cláudio Nucci, Zé Renato, Leny Andrade ( um espetáculo!), Leila Pinheiro, entre outros, a obra traz crônicas contundentes, delírios poéticos e cordéis absurdos do sempre incisivo Aldir Blanc em músicas singulares, onde a melodia foge do padrão e sua construção trai os ouvidos, ora tensa, ora suave, ora atingindo o silêncio em uma nota inexistente. Uma obra surpreendente, dinâmica, que merece um estudo sério da crítica especializada.

Taí os 12 discos, que com muito custo consegui publicar. Não percam as próximas seleções vindas de grandes discófilos e fãs da boa música! Muita coisa boa vem por aí...

30 de dezembro de 2014

Baú do Malu 52 : Folheto da Gravadora Todamérica para o Carnaval de 1954




Folheto suplemento da gravadora Todamérica para o Carnaval de 1954, com grandes artistas do cast e suas respectivas interpretações de sambas e marchas para os dias de reinado do Momo. Bons tempos em que o Carnaval tinha mais opções musicais, ao contrário de hoje em que o mercado se concentra no axé da Bahia e no samba enredo das escolas.

27 de dezembro de 2014

"Discoteca Básica: 100 Personalidades e seus 10 Discos Favoritos"

Ganhei de Natal da minha girl esse divertido e instrutivo livro "100 personalidades e seus 10 discos favoritos". A ideia do organizador Zé Antonio Algodoal foi simples mas direto na jugular: músicos, produtores, escritores, artistas em geral, estilistas, colecionadores, designers, DJs, ex-VJs, entre tantos, escolheram aqueles discos que marcaram suas vidas e de alguma maneira fizeram parte daquela famosa e imaginária lista particular dos favoritos para uma ilha deserta ( como se em uma ilha deserta se pudesse ligar uma vitrola - e aquelas portáteis à pilha durariam pouco). Escolher 10 discos é tarefa ingrata e árdua para muitos; muitos outros discos favoritos acabam limados da lista final. De qualquer maneira é bem legal saber as escolhas de um Kid Vinil, por exemplo, conhecido pela sua gigantesca coleção, ou o Luiz Calanca, que trabalha com discos há décadas, ou ainda os vários músicos e críticos desta seleção - eu sou suspeitíssimo, por achar essa parceria/cumplicidade gente+ discos fascinante e hipnotizante ( nesse caso aqui, melhor ainda, pois há explicações pessoais e íntimas do porque das escolhas).Tanto, que vou girar essa ideia aqui no blog, com amigos e conhecidos que costumam devorar discos no jantar e compactos no café da manhã. Eu custo a acreditar que tem gente da nova geração que nunca sequer pegou um disco nas mãos, seja CD, LP ou compact disc. Nada contra o ato de baixar músicas, mas o disco é como um livro: tem sua história particular, tem capa, cheiro, encarte ( ou orelha e prefácio no caso do livro), apresentação, ficha técnica e isso pra mim sim é obra completa, com formato e conteúdo. Música solta é legal mas também é descartável.
Aguardem novidades aqui.

23 de dezembro de 2014

Joe Cocker (1944 - 2014)

Joe Cocker protagonizou uma das cenas mais icônicas do rock: sua apresentação apoteótica, marionética e gutural da beatle "With a Little Help From My Friends" no festival de Woodstock em 1969. A partir daí, por mais que tenha feito uma carreira preciosa, mantendo o punch rythm and blues, continuando suas incríveis versões às vezes melhores que as originais e ainda acrescentando no caminho um tom mais romântico ( mesmo sem nunca largar a interpretação rascante e as faixas mais rápidas), Cocker nunca conseguiu se desvencilhar daquele memorável número no famoso festival. Eu acompanhei sua trajetória profundamente - tenho seus três primeiros LPs, mais dois estourados dos anos 80 ( época em que foi premiado com a música "Up We Belong" com Jennifer Warnes e vendeu muitos discos. Eu particularmente, ouvi muito Joe Cocker nos anos 80, principalmente "You Can Leave You Hat On" de Randy Newman e "Unchain My Hearth" de Ray Charles) e pelo menos três CDs. Muitos aqui no Brasil o conhecem pela emocionante abertura do seriado "Anos Incríveis", com sua versão beatle única embalando cenas familiares ( abertura essa que sumiu da internet por problemas de licenciamento que acabaram tirando a música do seriado na sua versão em DVD). Fui convidado pelo caríssimo Marcelo Mazuras para assistí-lo em sua última apresentação em São Paulo (2012) , mas acabei me enrolando e não fui. Uma pena. Joe Cocker é com certeza um dos maiores vocalistas que o nosso planeta presenciou e certamente estará entre os favoritos da minha lista musical definitiva que levo pela vida afora.
https://www.youtube.com/watch?v=bRzKUVjHkGk

21 de dezembro de 2014

Rolling Stone 100

A revista Rolling Stone Brasil chega ao número 100 muito bem disposta, trazendo como reportagem de capa a interessante seleção com os "100 Maiores Momentos da Música Brasileira", que vai da criação do chorinho "Odeon", em 1910, até 2011, com "Não Existe Amor em SP" de Criolo, disponibilizada em 16 páginas. Uma bela pesquisa que merece ser guardada. Na edição também merecem uma lida a seção "Discografia" assinada pelo ótimo Paulo Cavalcanti ( que também é responsável pelo box "Acervo Pessoal"), destacando nesse número as obras do maestro soberano Tom Jobim, e as matérias sobre Stephen King, os bastidores do último O Hobbit ( e toda a história da obra de Tolkien no cinema pelas mãos de Peter Jackson) e (finalmente) uma matéria destrinchando 15 clássicos do mestre dos mestres da composição, mito da Motown, Smokey Robinson. Uma grande edição que traz a magazine em grande forma no Brasil - a mesma revista que teve uma primeira dentição ainda nos anos 70, com espírito underground e formato zine típicos da época - e que há oito anos iniciou essa nova existência no país, até mais encorpada do que a americana, inserindo além da música - lançamentos, news e seus bastidores -, política, sociedade, cultura, cinema, ecologia, tecnologia e moda/comportamento. A fórmula deu certo. Que a RS Brasil prossiga com esse punch , pois já está se tornando clássica, assim como foram as anteriores "Música", "Pop", "Som Três", "Pipoca Moderna", "Bizz", entre outras.
No site da RS, 10 dos 100 maiores momentos da nossa música: :http://rollingstone.uol.com.br/galeria/os-10-maiores-momentos-da-musica-brasileira/#imagem0

19 de dezembro de 2014

Baú do Seu João 9 : Lata-miniatura do Shell Excede (Super Motor Oil) com jogo da memória de automóveis/veículos (1970/2)

Essa latinha que era distribuída nos postos Shell entre 1970 e 1972 ( não tenho a certeza do ano) é verdadeiro item de adoração de muitos marmanjos que tiveram o prazer de vê-la ao vivo e/ou puderam destrinchar todas as 90 peças redondas do seu jogo de memória, com fotos de 45 veículos da época - incluindo aí carros de passeio, de carga, caminhões e até um ônibus e um carro de corrida. Verdadeira relíquia, não é muito fácil de achar por aí em perfeito estado. Eu já vi em antiquários duas vezes: na primeira, a latinha estava muito enferrujada e faltava peças; na segunda, a latinha até estava boa, mas lhe faltava a tampinha e algumas peças. Graças ao Seu João, que sempre dá aos seus guardados um cuidado de tesouro, e por conta desse cacoete, consegue preservar diversos itens, essa latinha da foto, que eu tive o privilégio de manusear e brincar na época ( sob sua guarda, é claro) está em perfeitas condições, 40 e tantos anos depois, como se pode ver nas imagens.

Na internet, alguns fãs, como o jornalista Flavio Gomes, já postaram sobre essa preciosidade:


17 de dezembro de 2014

Foto do Mês: na Feira Livre do Vinil de Santo André (13/12/2014)

Foto tirada no sábado passado na 112ª edição da Feira Livre do Vinil de Santo André. Eu e meu filho Gabriel, ao lado do expositor e amigo Carlinhos, que além de ser um baita conhecedor de MPB, rock e música em geral, é um sujeito barra limpa, gente finíssima, daqueles que a gente pode contar sempre. Em mãos, alguns itens que encontrei entre tantas raridades presentes no point do Carlinhos na feira: Telecoteco Opus nº1 com Dilermando Pinheiro e Cyro Monteiro ( 1966), um curioso LP do eclético programa radiofônico da Kolynos, apresentado pelo Estevão Sangirardi, "Música e Alegria" ( esse é o de nº 1365, de 1973), o discaço do Traffic, "John Barleycom Must Die", de 1970 ( uma volta do grupo que qwuase saiu como solo de Steve Winwood), e o primeiro LP do grupo Suzi Quatro (1973). Depois, ainda consegui em outra banca o ótimo primeiro disco do grupo Roxy Music ( 1972 ), grande expoente do rock experimental dos anos 70. A feira rola todo mês na galeria Campos Sales em Santo André. Mais informações e datas no blog:  http://feiralivredovinil.blogspot.com.br/

14 de dezembro de 2014

Comic Con Experience 2014

Entrada da Comic Con Experience vista da Imigrantes
Na semana passada eu e meu filho Gabriel compartilhamos momentos memoráveis dentro da Comic Con Experience 2014. Eu não tinha feito nenhum pacote com antecedência e tudo foi bem de supetão mesmo. Não fui atrás de autógrafos ou fotos com famosos, e por isso mesmo evitei qualquer fila que ultrapassasse três metros. Mesmo não levando a assinatura do grande Don Rosa pra casa ( um dos melhores artistas Disney pós Carl Barks) não me arrependi. Ter encontrado e conversado com grandes colegas do mundo dos quadrinhos e dos cartuns como Gilmar, Orlandelli, Heitor Pitombo ( finalmente o conheci pessoalmente), André Diniz, Marcatti, Flavio Luiz, Klebs Jr, Lauro de Luna Larsen, Claudio Juris ( com os esquilos!), Will, Rod Reis, Laudo, Gustavo Duarte, Daniel Esteves, Guilherme Kroll, da Balão, Marcelo Naranjo, Manoel de Souza, entre outros, já valeu e muito. Também tive o prazer de conhecer o Eric Pelejas e o Pedro Hutsch Balboni, ambos fazendo um trabalho de qualidade nas HQs independentes. Pra não perder o costume, passei nos estandes de Celso Comic Hunter e Marcio Emporio HQ, atrás de raridades em promoção. Tirando o preço salgado da entrada ( que aliviou um pouco com os livros doados) e a desorganização da parte externa ( fiquei numa fila errada por quase meia hora, por culpa de uma informação errada de um voluntário do evento), o I CCEX deixou ótimas impressões. Tinha atrações pra todo o gosto, a turma do cosplay espalhou criativamente centenas de personagens clássicos da cultura pop, os estandes de toys e colecionáveis foram muito bem montados, e editoras presentes como Leya e Aleph disponibilizaram itens com preços bem convidativos. Muitos locais não tinham sinal da maquininha de débito e dentro só tinha caixa do Bradesco, detalhe inconcebível num evento desse porte. Algumas mancadas devem consertadas na edição 2015, já confirmada pela produção. No mais, a equipe toda, Ivan Freitas a frente,está de parabéns, pois o evento foi incrível e com um perfil jamais visto no país. Longa vida ao Comic Con Experience! Seguem as fotos:

Nova escultura do Mickey com homenagem ao Pato Donald nº1 da Editora Abril (1950)

TV Bandeirantes, à caráter, entrevistando um dos Batman do evento

Com Han Solo


Em meio à cosplays, games super modernos e animação digital, um raríssimo exemplar do jornal Dom Quixote, de 1902, chamou a atenção no estande do Márcio, da Empório HQ. Nesse exemplar acima, tem uma aventura de Zé Caipora, uma das pioneiras histórias em quadrinhos do visionário  artista e editor Ângelo Agostini.

Personagens de 'Hora de Aventura' dão as boas vindas na Imigrantes.

Lanterna Verde do Sertão

Salsicha e o famoso furgão

Artes originais de Rod Reis

Pôster de Orlandelli

Itens da sacola

O pintor Charles Oak

Gabriel e Mestre Kame







9 de dezembro de 2014

A estátua do Tom e a outra estátua

Divulgação
Ontem, em comemoração aos 20 anos da morte do maestro e compositor Tom Jobim, foi inaugurada estátua em sua homenagem na praia de Ipanema. Justíssimo, e numa praia que não poderia ser outra. Tom Jobim reinou soberano nessas areias ( embora depois de uma acidente bobo na juventude tenha trocado a água pelo asfalto, mais precisamente os bares e botequins da orla). O que se espera é que não aconteça o que aconteceu com a estátua de outro gênio, o poeta Drummond de Andrade, que teve a sua estátua erguida em 2002 em Copacabana e logo em seguida sofreu depredação ( fato que depois se repetiu várias vezes, em ataques ainda piores). Que haja uma vigilância por perto para que o monumento fique intacto e divulgue aos turistas e visitantes a imagem de um dos maiores músicos do planeta.
Na época do vandalismo de 2002, fiz uma poesia sobre o ocorrido ( publicada no livro "Aura de Heróis", lançado em setembro deste ano). Segue o trecho da matéria de introdução e a poesia na íntegra ( como foi publicado no livro):


Velho Poeta

Vândalos voltam a atacar estátua de Drummond no Rio
          Folha Online 24/11/2002

”A estátua em homenagem a Carlos Drummond de Andrade, localizada em Copacabana, Rio, voltou a ser alvo da ação de vândalos. Uma haste dos óculos do poeta foi quebrada.
Inaugurada em 30 de outubro para marcar os 100 anos do poeta, a estátua foi pichada dois dias depois. Garis foram acionados para a limpeza.
A estátua, em tamanho natural, foi colocada em um banco da praia, onde Drummond costumava passear.”

 Drummond, velho poeta
que tanto caminhava na orla
com a brisa matutina predileta
e o calçadão de Copa em sua sola

Drummond, velho poeta
erigiram uma estátua sua bem quieta
sentada de bengala e com a cara reta
a observar os banhistas e as bicicletas

Drummond, velho poeta
Já no segundo dia picharam seu traje
e quebraram seus óculos com três semanas completas
Assim que acabar o mês o que virá de ultraje?

Drummond, velho poeta
sei que havia uma pedra no caminho
e nada mais agora te afeta
pois é ‘gauche’ inabalado, com asas e espinho

Ignorou com elegância o ocorrido
estático no bronze que o completa
continua vivo mesmo que tenha morrido
dizem que até sorri, Drummond, velho poeta



(2002)

7 de dezembro de 2014

Capa do Mês: A Mulher e o Diabo - Berilo Neves (1932) Arte de Manuel Constantino


Esse livro raro e chamativo eu encontrei no Sebo do Carlinhos, que me mostrou na semana uma gaveta recheada de edições bacanas impressas entre 1870 e 1940, a sua "gaveta das raridades". Não precisa nem dizer que babei diante de publicações tão esplêndidas. Berilo Neves foi um jornalista e contista de muito sucesso nos anos 30. com um pé na ficção científica. Já essa arte de capa com cara de quadrinhos foi feita por Manuel Constantino, pintor, arquiteto, museólogo e restaurador. O artista viveu entre 1899 e 1976 e é considerado um dos grandes mestres de natureza morta de cores quentes, embora adorasse pintar nus e paisagens. Essa sua capa, para a 2ª edição de "A Mulher e o Diabo", foi feita em 1931 ( não consegui encontrar imagens da 1ª edição para saber se era essa mesma arte. Edições posteriores não repetiram mais essa ilustração de Constantino). Não li o livro ainda, mas essa capa certamente enriquece a obra.

30 de novembro de 2014

Paul em Sampa - o ingresso


Paul McCartney em São Paulo -  Allianz Parque - 25/11/2014. Eis a cara do ingresso de um show que entra para a História.

29 de novembro de 2014

Roberto Gómez Bolaños (Chaves/Chapolim Colorado) (1929-2014)

Bolãnos foi um grande comediante: um dos poucos que conseguiram extrair da simplicidade um humor puro e global. Da falta de recursos cênicos, da eterna luta de classes, do dia-a-dia da vizinhança pobre mas cheia de dribles e sutilezas, seu personagem Chaves atraiu um público eclético, desde a primeira fase da infância até a terceira idade. Meu pai, por exemplo, gargalhava copiosamente sempre que via as gags do programa, que tinha um elenco muito bem afinado e entrosado ( embora fora das câmeras muitos tenham entrado em conflito quanto à hierarquia e visibilidade nos quadros e disso tenham surgido programas simultâneos com o elenco separado. Nos últimos anos quase todos se reaproximaram). As piadas e gags muitas vezes beiravam a tontice e algumas eram repetidas à exaustão, mas quem dos fiéis telespectadores do programa se importavam com isso? essa fidelidade canina dos fãs de Chaves foi o que segurou por um tempo recorde - mais de 30 anos - o programa na grade do SBT. Chapolim também era um grande personagem do nonsense, adorado pelas crianças, principalmente, mas também pelos nerds. Assim como os Trapalhões clássicos, o mexicano Bolãnos deixa uma extensa ficha trabalhista para o humor da classe média latinoamericana.
Abaixo, uma retrospectiva na página do SBT, e duas artes que andaram sendo compartilhadas entre ontem e hoje na rede.
http://www.sbt.com.br/sbtnaweb/tarolando/lista.asp



28 de novembro de 2014

Paul em Sampa (25/11/2014)

Como eu comentei com meu amigo Henrique , "Depois de ver ao vivo os Rolling Stones duas vezes, e agora, assistir a um beatle live - já posso me sentir realizado no quesito shows". Com todo respeito às outras bandas e músicos que admiro - mas Stones/Beatles pra mim estão na “estrato” - muito além da atmosfera comum da música. E Paul McCartney, que eu já venerava como compositor/ instrumentista/cantor, mostrou que é realmente um profissional além das expectativas e um cara naturalmente generoso. Valeu toda a saga que eu, minha mulher e os rebentos passamos até sentar na cadeira e assistir um dos maiores shows de nossas vidas. Pegamos a fila na terça-feira 25 já dando quase a volta completa no recém inaugurado Alianz Parque, e não era ainda 16:30 h. O céu estava escurecendo, mas a chuva só veio castigar a gente duas horas depois, e aí dá-lhe capa de chuva ( que eu consegui por R$5,00 dois minutos antes do toró - com a chuva inflacionou pra R$20,00), e resignação para aguentar água intermitente na cara e bota encharcada pesando uns 10 quilos no pé. O que ocorreu foi que a produção externa do show, depois do dilúvio, perdeu totalmente o fio da meada e a fila gigante que seguia uma certa lógica e divisão antes, acabou entrando na onda (literalmente) e virou um grosso bloco rumo aos portões, graças às fileiras que se misturavam e aos furões que iam engrossando a massa compacta. Outro agravante é que os portões só abriram depois das 18h30h, quando todo mundo já estava com água até no cérebro. Mas tudo pelo Macca! adentramos o estádio sãos e salvos perto das 19 horas e aí foi só aguardar o grande momento, marcado para as 21 horas. No estádio, a produção dava conta e tudo estava muito tranquilo, apesar da lotação ( e sem chuva na cabeça, graças à cobertura). 

Sir Paul só apareceu às 21:45h, mas foi logo tascando um clássico beatle, “Eight Days a Week” (do álbum Beatles for Sale, de 1964), pra mandar embora qualquer desconforto. E foi a partir daí que comprovamos que essa turnê atual é realmente uma grande homenagem aos Fab Four, desde a maioria das músicas presentes no setlist ( das 39 músicas, mais de 20 foram da era Beatles) até homenagens explícitas a George e John. A celebração era clara: em cada música, Paul reverenciava um instrumento ( violão, baixo, guitarra), levantando-o acima da cabeça no final e louvando-o. Outra constatação no decorrer da apresentação foi o foco total no “rock”, sem nem cheiro da fase mais pop de meados dos anos 80. O roteiro estava ali no script, mas o compositor deixou tudo muito leve e  natural, desde as expressões e gírias engraçadas em português ( “ô meu”, Sampa, “bombando”, molecada, “é nóis”) até as simpáticas saudações ao público. O setlist também não trouxe surpresas em comparação com outros shows da turnê, mas as músicas foram tocadas com tamanha intensidade e vigor – lembrando que é um dos últimos shows de uma turnê de um ano e o homem tem 72 anos ( 55 de rock) – que surpreenderam a todos da mesma forma. E é incrível pensar que ele é um dos poucos com tanto tempo de estrada ainda com músicas novas pra mostrar – no show foram quatro canções, do ótimo último trabalho, “New”, do ano passado – e que mantém a temperatura do show com qualidade. Paul e banda não tem integrantes exclusivos para backing vocals e nem precisa: o chefe não sofre de falta de fôlego em nenhum momento; muito pelo contrário, estraçalha em músicas altas como “Maybe I’m Amazed” ( do primeiro álbum solo de 1970, uma das mais emocionantes do show), e rocks pesados dos primórdios, do Wings  e do álbum branco ( como “Helter Skelter” e “Let Me Roll It”). E a banda, atinada, afiada, tocando a um bom tempo com Mccartney, dá conta do recado direitinho, numa sinergia fluente e aparente no palco. Em “Paperback Writer” ( single beatle de 1966), mostrou com orgulho a guitarra , avisando ser ela a mesma da época em que compôs o hit. 

Os clássicos foram se enfileirando, intercalando guitarra, violão e piano: “All My Loving” ( de 1963, a preferida do meu filho Gabriel), “The Long and Winding Road” ( do LP Let it Be, de 1970), “I’ve Just Seen a Face” (de Help, 1965), “We Can Work Out “(single de 1965), “And I Love Her” (de 1964), “Another Day” ( single de 1971, queridinha da minha filha Letícia), além da  inserção de um trecho de “Foxy Lady”, homenageando “the king” Jimi Hendrix. Um momento alto do show ( literalmente) é quando o artista é alçado para o alto na parte elevadiça do palco para tocar a mágica “BlackBird” (álbum branco – 1968), aqui com um approach político vindo das cenas de direitos civis no vídeo exibido logo abaixo de seus pés. Em seguida, mais uma dose cavalar injetada no coração: a homenagem à John Lennon na emotiva “Here Today” ( do solo “Tug of War” de 1982). E dá-lhe mais estupefação e êxtase na sequência clássica: “ Lady Madonna” ( de Let it Be, 1970 – número que fez a banda Cachorro Grande estrebuchar na pista), a divertida “All Together Now” ( de Yellow Submarine, 1969), “Lovely Rita”, “Being for the Benefit of Mr.Kite!” ( essas duas últimas do álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, de 1967, pelo menos pra mim, as maiores surpresas do show ao lado das homenagens. A última é cantada por John no original) , e “Eleanor Rigby” ( essa, do álbum Revolver, de 1966, é uma das ‘preferred’ da Cris). Outra homenagem arrebatadora veio na sequência: a singela versão de “Something”, de George Harrison, com direito à ukelelê na introdução ( mais uma prova que o instrumentista Paul é craque nas cordas). A plateia veio abaixo. E foi nesse clima que a banda engatou uma trinca de trincar o chão: “Ob-La-Di,Ob-La-Da” (do branco, 1968 – confesso que sempre achei ela boba, mas ao vivo cresceu muito no meu conceito), “Band on the Run” ( classicaço do Wings, a banda setentista de Paul) e “Back in the U.S.S.R” ( com uma hiperativa seleção de imagens no vídeo simultâneo). O show já se encaminhava para a última parte, quando se aquietou para a essencial “Let it Be”, uma das músicas mais conhecidas do mundo, subiu a adrenalina again com a explosiva “Live and Let Die” ( com as manjadas explosões e fogos de artifício – que mesmo óbvias, foram de arrepiar) e fechou com outra arrebenta peito, “Hey Jude”, com seu coro de encerramento característico e providencial. A chuva nesse momento apertou e quem estava na pista sentiu mais uma vez o baque. Mas o jovem Paul McCartney logo voltou para o primeiro bis, com o mesmo pique, pra puxar com o baixo “Day Tripper” ( essa, de 1965, era preferida do Hendrix), “Hi Hi Hi” (rock and roll do Wings de 1972) e “I Saw Her Standing There” (ieié dos melhores, circa 1963). O segundo bis, mais chuvoso ainda e mais arrasador, chegou com “Yesterday” (de 1965 – Help!- a música mais tocada no mundo), a cataclísmica “Helter Skelter” ( do álbum branco too – Paul fez questão de executá-la com o baixo, tal qual na original), e fechou a noite com a bela e proposital sequência “Golden Slumbers” (uma das melhores composições de Paul na minha humilde opinião), “Carry  that Weight” e “The End” , todas do excelente Abbey Road, de 1969.  Era  “the end” pra nós, depois de quase três horas de transe puro. Mas ao invés de adeus, Sir McCartney manda um “até a próxima”, e esse não foi um aceno de script apenas, mas a sua real empatia com o Brasil e a convicção pessoal de que vai mesmo voltar em breve. Energia ele tem de sobra. Eficiência também. E como trabalha para isso esse genial inglês!
Só não digo que o mundo pode acabar depois dessa, porque quero estar na próxima turnê dele no Brasil. Estamos te esperando, Paul.  Valew, meu!

  
Day After

O dia seguinte, como mágica ( Magic Mistery Tour?), manteve a aura beatle pairando sobre nossas cabeças. A Letícia, na correria da saída, deixou sua bolsinha, com celular dentro, pendurada nas costas da cadeira em que estava, dentro do estádio. Lá fomos nós atrás dos Achados e Perdidos do Alianz Parque, até descobrirmos com o segurança, que ainda não tinham montado esse setor. Aí eu cismei de ligar no celular dela, mesmo sem muitas esperanças, e um alô do outro lado me confirmou a sorte danada que essa menina tem –  Renato, o cara que estava do nosso lado no show, viu o celular, guardou-o, carregou-o a noite toda, levou-o para o trabalho e só estava esperando alguém ligar. Existe uma pessoa assim nesses dias? a humanidade não está inteiramente perdida. Combinamos de se encontrar no shopping Bourbon e foi durante essa espera que os astros do rock mais uma vez mexeram os pauzinhos lá em cima. Primeiro, vejo passar o Oswaldo Vecchione com sua esposa, indo para o show. Pra quem não sabe, Oswaldo é um dos maiores roqueiros do Brasil, fundador da banda de rock mais longeva dessas plagas, o Made in Brazil. Claro que fui lá cumprimentá-lo e apresentá-lo ao meu filho Gabriel, que tá tocando uma guitarra de responsa. Depois desse simpático encontro, quando me preparava para ir embora, eis que surge direto do Rio de Janeiro, o grande Marcelo Fróes, com um amigo, também dirigindo-se para o show, logicamente. Fróes, produtor e pesquisador, um dos maiores especialistas em Beatles do país e dono do selo Discobertas ( pura arqueologia em disco – basta olhar as últimas caixas que estão saindo com artistas brasileiros. Ouro puro!), é amigo de George Martin e já se encontrou com Paul McCartney em Abbey Road. Eu o conheci há uns 15 anos atrás, em uma de suas pesquisas dentro da Editora Abril e desde então temos mantido contato. A conversa foi rápida, mas fechou com chave de diamante esses loucos e incríveis dois dias em que Paul McCartney esteve em Sampa.

24 de novembro de 2014

Tammi Terrell

Tammi tinha tudo pra engatar uma carreira de prestígio nos anos 70. Ótima voz, carisma, tinha estourado nas paradas em 1967, ao lado do efervescente Marvin Gaye em “Ain’t No Mountain High Enough”, parceria que deu certo e rendeu vários encontros seguintes. Topou com o sucesso aos 22 anos, depois de debutar para a música ainda criança em corais de igreja, vencer competições de talentos a partir dos 11 anos e abrir shows para artistas famosos com apenas 13 anos! Assinou seu primeiro contrato com a gravadora Scepter, ainda como Tammy Montgomery, e até conseguiu certa popularidade em shows ao vivo, embora em disco não encontrasse essa receptividade. Até que numa apresentação na Filadelphia, conhece o boss James Brown, que fica fascinado por ela e convida-a para sua gravadora, a Try Me, produzindo seu terceiro álbum e a colocando como backing vocal em sua banda. Foram 9 meses de turnê, poucas vendagens do disco solo e uma relação conturbada com Brown. Caiu fora desse quadrado perigoso e em 1964 lançou os últimos singles usando o sobrenome da família ( seu nome no registro era Thomasina Winifred Montgomery), “If I Would Marry You/This Time Tomorrow”, pela gravadora Cheker. Uma nova decepção nas paradas que a leva a repensar a carreira e até se inscrever para curso de medicina. Mas então no ano seguinte, em uma apresentação com a banda de Jerry Butler, chama  a atenção do todo poderoso da Motown, Berry Gordon Jr., que a contrata no ato para o cast da gravadora. Nesse momento, a artista vira Tammi Terrell e uma etapa promissora na carreira tem início. Grava alguns singles na casa nova – “I Can’t Believe You Love Me”, “Come On And See Me”, “This Old Heart Of Mine”, “Tears At the End of a Love Affair”, mas nenhum passa do Top 40 da parada R&B da Billboard. Enfim chegou 1967, o ano em que substituiu a cantora de soul Kim Weston para fazer dupla com Marvin Gaye e sentiu pela primeira vez o gosto do sucesso. 
O duo Tammi/Marvin engatou um sucesso atrás do outro em dois anos: "Your Precious Love", "If I Could Build My Whole World Around You", "Ain't Nothing Like the Real Thing" e "You're All I Need to Get By", além dos LPs "You're All I Need" (1968) e "Easy" (1969). Mas no mesmo ano que lhe trouxe sorte, um grave problema de saúde – enxaquecas insuportáveis – a faz ter um colapso em pleno palco, ao lado de Gaye. Exames revelam um tumor cerebral maligno, e a partir daí, embora continue gravando em estúdio, suas condições físicas vão se esvaindo. Após oito cirurgias infrutíferas, Tammi Terrell falece aos 24 anos, em 16 de março de 1970. Abalado com a perda, Marvin Gaye larga sua carreira e fica em total isolamento por um ano. Volta em 1971 com uma nova postura musical, mais séria, política e pessoal, e uma de suas obras primas do ano, também uma de suas maiores criações, “What’s Going On”, foi feita em boa parte como reação à morte da parceira musical. Possivelmente Tammi Terrell iria se dar bem nos conturbados e doidos anos 70, que se mostrou uma década muito fértil para a música negra. Marvin Gaye, abalado, doído, sangrando por dentro, seguiu solo, com discos geniais e vida pessoal conturbada como a de sua amiga Tammi. Quatorze anos depois da despedida de Terrell, encontrou sua tragédia pessoal: em 01 de abril de 1984, véspera de seu aniversário de 45 anos, foi morto pelo seu próprio pai, após uma acalorada discussão.Tammi Terrell, fulgurante e rasante como um cometa, deixou como legado para a música soul, sua interpretação intensa e radiante, simultaneamente doce e forte, como sua presença. 

https://www.youtube.com/watch?v=IC5PL0XImjw 
https://www.youtube.com/watch?v=FbX66Ddxtow 
https://www.youtube.com/watch?v=svAs-6MiqxE 
https://www.youtube.com/watch?v=8ZkOm_LogpI  
https://www.youtube.com/watch?v=Eu_HX2sgW8A (musical de 2010 - idênticos!)